Mediante estas belas mentiras...

digo sempre o que tenho de verdade.

26.7.05

Homo Lata















De repente, eles trocaram o homem pela máquina. Afinal, a máquina é perfeita. O homem erra. Por acaso, você já ouviu falar na frase "Errar é mecânico”? (pausa) Mas "Errar é humano" você já ouviu, com certeza.

De repente, eles trocaram o homem pela máquina. Afinal, se a máquina der problema, eles consertam. Trocam alguma peça. Trocam de máquina. Agora, consertar um homem é muito complicado. Trocar as "peças" do homem também sempre foi difícil. Trocar de homem, a não ser para certas mulheres, também não é nada fácil.
De repente, eles trocaram o homem pela máquina. É. Isso aí mesmo. Disseram que era por causa da produção. A maquina, lógico, produz mais. Disseram que era por causa do custo. A maquina, lógico, gasta menos. E quem consome é o homem. E o homem quer consumir cada vez mais por cada vez menos.
Vocês devem estar pensando que eu ia dizer, de novo: "De repente, eles trocaram o homem pela máquina". Mas eu não vou dizer isto não. Afinal, vocês já entenderam. O homem perdeu seu lugar para a máquina. (pausa) Olha! Frase nova!
O homem perdeu seu lugar para a máquina. O homem comum não tinha vez. Era preciso ser diferente. E para isso, se criaram modelos a serem seguidos. E novos modelos de homens criaram novos modelos de máquinas, que substituíam homens.
Pelo menos no posto de consumidor o homem ainda não perdeu o lugar para a máquina. Mas quem disse que teríamos máquinas fora dessa? O homem mora em lugares construídos com a ajuda de máquinas. Seu meio de locomoção é uma máquina. Os alimentos pelo homem consumidos são feitos pela máquina. O cafezinho sai da máquina! Até as mulheres de certos homens mais parecem máquinas - de lavar.
O homem não precisava da máquina. Mas a criou, e passou a precisar. Perdeu seu lugar para ela. Se hoje um homem é bom em alguma coisa, dizem que parece uma máquina. Mas se pararmos para pensar, o homem não passa de uma máquina mesmo. É Incrível!
Tanto o homem quanto a máquina, se tiver algum problema, é preciso resolvê-lo para que volte ao normal. Se esquentar muito, é preciso dar uma esfriada. Se virem que faz tudo bem feito, já vão querer explorar. Até que se parecem bastante.
Hoje em dia, é tudo mecanizado (mecanizado), computadorizado (computadorizado), industrializado (industrializado). Enlatado (enlatado). Hoje em dia, tudo é padrão (tudo é padrão). Buscando ser diferente tudo é igual (tudo é igual). E a cada dia, alguma coisa é feita para ser melhor que a outra. E amanhã já será superada. E o que esperar do homem?
O homem não é um robô. Nem uma máquina. O homem é um produto. Um produto que ele mesmo consome.
Esse produto tem preço, data aproximada de validade, nota fiscais, inúmeros manuais de instruções e profissionais que cuidam de sua manutenção. Pessoas que fazem com que este produto, o homem, esteja pronto para consumo. Nunca se viu, propriamente dito, o produto homem sendo vendido. Mas isso está muito próximo.

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Texto escrito em 2004 e convertido para performance, apresentada na ETESP. O mesmo já foi gentilmente publicado por Oliver Cauã Cauê em seu blog.

22.7.05

To The Oscar I've Gone














Quarta-feira e este inverno meu traiu. Saí de óculos escuros.
Resolvi na noite anterior o que faria no dia desocupado que estava para amanhecer e já destaquei dois selecionados no guia: um filme e uma exposição. Era por volta de três horas da tarde quando cheguei ao HSBC Belas Artes. A moça bilheteira confirmou o horário. O filme era "Casa de Areia". Queria a sessão das duas, mas a feijoada fora de ocasião que me serviu de almoço em casa acabou por escolher a sessão das quatro e vinte. Eu teria uma hora tranqüila para ler "Restou o Cão - e outros contos", de Ligia Garcia-Roza. Para distrair. O trânsito-caos que seguia a Consolação só atrapalhou no começo.
Simplesmente deslumbrante, o filme. Belíssimas e emocionantes imagens e atuações. Sem dúvida alguma, uma obra que traz restrições para ser apreciada pelo grande público. Porém, não é difícil se envolver naqueles densos lençóis maranhenses, os quais caminharam as incríveis Fernandas.
O inverno tarda mas não falha. Saí e dei de cara com o vento frio característico. Tratei de pegar a blusa, o mapinha básico e andar rumo à Galeria Bergamin para ver a exposição "Através", com obras de 'grandes' nomes da arte brasileira. Descendo a Bela Cintra e atravessando as alamedas. Santos, Jaú, Itú, Franca, Tietê, Lorena, e eu atravessando e lembrando de quando eu vinha, antes na Alameda Franca, e depois na Santos, consultar-me com o Marco Antônio, psicólogo, quando criança. Lembrei do passado mas não do mapa. Acabei fazendo outro caminho. Fui direto na Oscar Freire e acabei não achando de primeira a tal travessa, aparentemente inexistente. Voltei até a Rua Augusta, desci a 120 por hora até a Rua Estados Unidos, dobrei à esquerda e subi pela Padre João Manuel. Nem tinha esta rua no mapa. São tantos os idiomas falados naquelas esquinas que eu quase arrisquei um "Could you help me, please? I need to go to Rio Preto Street...". Deixa quieto. Resolvi continuar pela Oscar Freire. Achei a tal rua. Bem mixuruca. Rua Rio Preto. Era lá a Galeria. O segurança que fica do outro lado da rua me olhou feio. O recepcionista me antendeu bem, entregou-me o catálogo das obras e deixou-me à vontade. Não gostei da exposição. Tenho sérias dificuldades em gostar de arte moderna e contemporânea. Acho inclusive que também atiraria tomates no palco do Municipal, se vivesse naquela São Paulo de 22. Até que as obras de Ligia Pape e Abraham Palatnik agradaram-me. Em contrapartida, Hélio Oiticica e Alfredo Volpi me decepcionaram, tamanhos os nomes que têm. Não creio, neste caso, em importância histórica. Tudo bem, o problema está em mim, e não na arte. Fui embora. Claro, sorri para o segurança.
É impressionante o modo como somos vistos em ruas superluxuosas como a Oscar Freire. As pessoas me olhavam como se fosse um office-boy e tudo o que isso (in)significa pra eles. Talvez por causa da mochila. E eu apenas olhava curiosamente. Aquela rua, aquelas pessoas, a forma de distribuição das coisas. Todas aquelas boutiques, vitrines de preços altíssimos, caras até para olhar. Os cafés e bares lotados. Os italianos ouvindo música americana em seus iPod's, os americanos usando marcas italianas em seu vestuário da night. Os burgueses chiques caminhando lentamente. Eu disse chiques? Chique já era. Burguês é fashion, como no outdoor. Como na SPFW.
Eu já tinha caminhado pela Oscar Freire outras vezes, mas desta vez me senti incomodado. Dois gringos viados - ou metrossexuais - param para atravessar a rua ao meu lado. Talvez não fossem viados - ou metrossexuais. Eu, um tanto retrossexual e homofóbico, até tentei decifrar o inglês sugestivo da dupla, mas acabei por apertar o passo quando o sinal abriu. Um senhor japonês, que também estava para atravessar, fez uma cara desacreditada. Continuo a observar. Tudo é muito limpo, bonito, iluminado. Fashion. Ninguém com uma cara que expresse verdade. Principalmente as garçonetes. Somente os seguranças. E nas esquinas das boutiques que fecham cedo, os moradores de rua fazem um simpósio de inverno. O chinelo Havaianas da menina e a bota Arezzo da moça. As duas cruzando olhares na esquina, até a moça atravessar sabe quantas alamedas até o café.
O filme foi excelente. A exposição, desagradável. A Oscar Freire, terrível. Na Augusta, eu indo para o ponto de ônibus, um rapaz vasculha o lixo para ver se encontra alimento. Uma mulher vasculha a agenda de telefones em seu aparelho celular para ver se encontra amigos pra jantar. O ônibus não vem. O rapaz nada acha. O telefonema da mulher deve ter dado caixa postal.
No ônibus eu continuaria lendo os contos de Garcia-Roza. Mas o dia poderia ter tido um final melhor. Talvez tenha, para a moça da bota Arezzo e seu belo sorriso sem graça.
Acho que Zeca Baleiro estava certo:
as meninas dos jardins gostam de rap
as meninas dos jardins gostam de rap
as meninas dos jardins gostam de happy end.

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Texto escrito no dia 13/07, quarta-feira, ao fim da noite

18.7.05

Meu pedaço na partilha


A curiosidade certamente é uma das maiores culpadas da evolução humana.


Só lamento pelo pobre gato, que morreu de curiosidade.
Seguindo a linha da curiosidade, me pergunto:
"O que teria dito o protagonista ao antagonista, momentos antes de entrar em cena, na primeira peça de teatro da história da Humanidade?" Talvez, se fosse eu, diria "Oi". Oi pra vocês também. Bom dia, comunidade.
Que grande tarefa essa, de escrever neste caderno. Logo eu?! Mas uma coisa nisso tudo me alegra, afinal, me deixaram por último, com tudo isso de folha sobrando. Pelo visto, já perceberam que sou um homem de muitas palavras. E aqui, neste bastão em forma de folha, folha que me dá o poder da palavra, o que escrever, para depois ler para todos vocês? Acredito que além de um diário de bordo, este belíssimo instrumento burocrático quadrado, dividido em folhas, subdivididas em páginas, repletas de linhas esperando para serem vestidas, seja um registro de partilha. E nada do que deixarei registrado aqui pode fugir do que já disse em todas as partilhas. Até mesmo quando passei a palavra no ato de recebimento.
Que bela convivência! Naquele primeiro dia, ainda meio frio, presenciando a soberania numérica feminina, todo aquele volume de sorrisos tímidos nas apresentações. Como foi bom dar aquela mentida para fortalecer a aparência, transmitir uma boa impressão. Acho que colou.
A decorrência dos encontros de sexta-feira à tarde, como foi boa! Aqueles exercícios de se soltar para si mesmo, conhecer seu corpo, e aos poucos, o corpo dos outros, saber lidar com tudo isso.
A forma de se comunicar em silêncio num mundo onde se grita tanto! Tudo é sonoro! Até a poluição já ganhou uma vertente sonora! Uma forma sonoplástica de manifestação e nós ali mudos diante de.. de.. de nós mesmos! Estou sem palavras.
O começo dos diálogos. A dramaticamente cômica forma de se comunicar para provocar reações nos outros. E rir, e fazer errado, e desconcentrar, e gritar no pensamento que não está bom e fazer aquela coisa ótima, que você leu que estava ótima toda aquela apresentação na face dos colegas.
Dançar, cantar, ler, ouvir, falar, se movimentar, movimentar o outro, movimentar o grupo, fazer o círculo, seguir a canção, pular a corda, passar o bastão, que coisa maravilhosa! Simplesmente teatralizar as tardes de sexta-feira. Essas tardes de sexta, que acabaram se tornando um percalço cotidiano de nossa semana. Ah, eu sempre quis escrever "percalço cotidiano" num texto. Já estava dois parágrafos pra baixo quando resolvi subir só pra encaixar isso... Encaixar da mesma forma que o teatro encaixou-se nas nossas vidas. Entre parágrafos, para construir nosso texto.
Teatro. Que palavrinha incrível. Sabe que a minha primeira lembrança de teatro foi receber das mãos da fada azul um livrinho da história de Pinóquio, ela de cima do palco, no final da peça, estendendo as mãos mágicas para o baixinho da platéia, de olhos encantados. Olha só o baixinho, no que se tornou. Um cara grande a quem foi mostrado o que é teatro, pra ele pintar da cor que quiser. Gente! Obrigado! Dizem que escrever palavrões acaba matando um texto, mas que se foda! Puta merda, gente, obrigado!
Sempre falta alguma palavra, mas nos tornamos seres resignados diante da perda. Mas me vem a felicidade quando eu me convenço de que a perda dessas minhas palavras já está solucionada com as palavras de vocês. Basta eu passar a palavra. Respira fundo. Nosso encontro passado foi nosso ensaio geral para o grande dia! O dia que será nosso e somente nosso. Seremos nós em cada gesto, cada diálogo, cada risada, cada aplauso ou cada vaia da platéia. Todo o sentimento de alegria, satisfação, decepção, desgosto.
O grande dia é só mais um jogo. Como todos os jogos de cena, com os quais nos comprometemos. Mas este grande dia se engrandece porque o jogo é de sentimento. E sem qualquer leve toque de sentimento nada se constrói. Razão e sentimento casam tão bem quanto tragédia e comédia. Que façamos um belo casamento. E que ninguém se pergunte se o que faz é certo. O sentimento não deve responder nada. Sua função é apenas a de se tornar culpado pela nossa evolução. Que coisa, mas que sentimento é esse? Eu talvez o chame de amor. Ninguém sabe o que é o amor, portanto reservo-me ao direito de dar seu nome a qualquer sentimento que eu acredito ser forte, ser puro, ser verdadeiro. E não há necessidade de entender o amor, ou medi-lo, ou justificá-lo. Há o dever de vivê-lo e não se deve fugir disso porque amor é no nosso instinto.

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Texto escrito para o caderno de partilha do grupo de teatro do qual fiz parte. Resolvi publicá-lo em consideração à nossa apresentação de domingo, 17/07. É extenso, mas muito importante.

16.7.05

Reflexão



Um cotidiano
estranho no espelho

Eu
Cada dia mais velho

me fito

Tem dias em que a gente
acorda mais bonito

11.7.05

Lista Telefônica














Alô? Alô? Alô...?
____________________Oi! Olá! Tudo bem? Tudo..
_____________________ _A ligação está péssima,
__________________________________ _ mas...
Hein? Como? ...Não!
________________________________ __Pois é...
_________________________ resolvi criar o blog.
______________________ _ Visita lá, e comente.
Ah, é? Está ocupado?
______________________ Desculpa, não entendi.
___________________________Repete... Quem?

A gente se fala.
Até mais.

Tu, tu, tu, tu, tu, tu, tu...